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quinta-feira, 27 de junho de 2013

Brasil x México: Uma Odisseia no Sol


Fomos ao jogo, Beth e eu, depois de ter tentado em vão transferir o ingresso dela. Depois do show do Paul, era compreensível que não ela não quisesse ir mais ao Castelão. Ainda por cima para assistir futebol, o que decididamente não a encanta tanto.

Não consegui transferir o ingresso o que serviu para indignar-me mais ainda com a FIFA. Estou a procurar um exemplo do tão propalado padrão FIFA. Filas na entrega dos ingressos, site cheio de bugs, com péssima usabilidade e ainda com a impossibilidade de escolher o local onde se quer sentar mostram que, antes de exigir das autoridades brasileiras, a FIFA tem que fazer seu dever de casa. Sugiro umas aulinhas particulares com a NBA.

O dia do jogo não começou muito bem para mim. Fui jogar basquete e machuquei o joelho (coisa de atleta Master L ). Ao voltar para casa de bicicleta, como habitualmente (nem tanto, pois o joelho acusava), identifiquei um ponto de parada de ônibus, que supostamente deveria coletar torcedores da região da Beira-mar para levar diretamente ao Castelão. Ficava a poucos metros de nossa casa e por isso decidimos ir de ônibus. Começava minha Odisseia.

13:30 chegamos ao ponto de ônibus. A fila de torcedores, em sol a pino, já estava formada e, embora não muito grande, foi suficiente para apresentar-me ao que me esperava. Detalhe: o suor começou a descer e o joelho começou a incomodar.

14:10 O ônibus chega enfim! Lota rápido. Eu e Beth quase não conseguíamos entrar. Sempre cabe mais um com jeitinho. Deu até nostalgia do tempo em que ia ao Náutico nos domingos. Ressalto, nostalgia, mas não foram saudades.

14:20 Ônibus lotado, muito grito e vaias. Aquele grito e vaia típico de cearense. Bem moleque. Beth se divertia. O joelho inchava. O motorista ainda tenta parar em outra parada. Muita gritaria. Não cabe mais ninguém! Ele continua e dobra na Desembargador Moreira em direção ao Castelão.

14:30 Percebo algo errado. Estávamos indo em um caminho que levava diretamente à passeata. Grito para o motorista: “É esse caminho mesmo?”. Ele nem responde. Peço permissão a alguns e chego do lado dele. Pergunto-lhe se ele não sabe que está havendo uma enorme manifestação bem à frente. Ele disse que sim. Insisto. “Qual é sua rota?” – “É essa mesmo Doutor.”. Pegou um papelzinho do bolso, leu em voz alta: “vá na Abolição, dobre na Virgílio Távora e siga em frente”. Ops! Falha. Alertei-lhe, não sem uma certa irritação, que ele não tinha dobrado na Virgílio Távora, mas na Desembargador Moreira.

14:35 Viro copiloto do ônibus. Começando com um balão nada fácil de ser feito na Raul Barbosa, começamos a voltar para pegar a rota do Iguatemi e Rogaciano Leite. Sorte nossa que o engarrafamento foi pequeno. Quando na Rogaciano Leite, o motorista me disse: “É por aqui mesmo Doutor. Agora estou lembrando do caminho”. Aha!

14:45 Chegamos na Oliveira Paiva. Tudo parado. Olhei no Google Maps. Estávamos a 4,3 km do Castelão. Comecei a me preparar para andar. Era só o que podíamos fazer. A Polícia havia bloqueado a entrada dos ônibus, pois os manifestantes estavam planejando mudar de local. Recebemos o alerta: “Desçam e corram” (só faltou o “negrada”). Correr como? O joelho tinha inchado muito e até andar estava difícil. Detalhe novamente: não há como esquecer que estamos na Terra do Sol.

15:10 Momento mais tenso. Vi-nos andando (não conseguia correr) em direção ao Batalhão de choque e à frente da passeata. Gritos de ordem dos dois lados. Alguns começaram a dizer “tão atirando!”. Até tenho simpatia pelos movimentos populares, mas confesso que não era exatamente daquele que tinha planejado participar. Se tivessem tirado uma foto desse momento, tenho certeza que pareceríamos líderes à frente da multidão. Começamos a rir. Tinha outra coisa a fazer?

15:20 Estávamos no meio da multidão. Como não conseguia correr, a passeata nos envolveu. Chegando à linha de frente, uns organizadores da passeata disseram para abrir espaço para os que queriam assistir o jogo. Até que enfim uma voz de bom senso no meio de um coro eclético de jovens já com máscaras e óculos para se proteger dos gases e sprays que pareciam ter certeza de que viriam.

15:25 Passamos da cavalaria com alguns outros retardatários mostrando os ingressos.

15:40 Chegamos ao estádio. Nosso assento era bem na frente daquele que havia nos acompanhado durante toda essa jornada: o sol.

16:00 Cantamos, ou melhor, gritamos o hino. O melhor momento de todos. Hoje, indo de táxi para o aeroporto em São Paulo, ouvi do taxista o quanto ele tinha se emocionado com a forma como cantamos: “Vocês, lá em Fortaleza, emocionaram a gente com aquele hino”. Ele disse que havia gravado na Internet e escutava de vez em quando com os filhos. Só então percebi o impacto nos outros que não estavam lá. Não falarei do jogo. Dele vocês já sabem tudo.

16:10 Beth olha pra mim e diz rindo: “Você está derretendo como picolé”. Sem comentários.

16:30 O sol nos deu ciao. Não lamentei nem um pouquinho.

17:40 Decidimos sair. O jogo estava 1 a 0. Meu joelho era uma bola, só não tão grande quanto a que o Neymar estava jogando. Não sabia como conseguiria andar, entrar no ônibus, enfim, fazer o trajeto de volta.

18:00 Na caminhada, encontrei com velhos amigos que nos acompanharam e que me ajudaram a esquecer do joelho. Vimos o cenário de destruição oriundo da batalha entre manifestantes e polícia. Soubemos que tinha sido antes mesmo do jogo ter iniciado. Ou seja, logo após nossa passagem.

18:15 Encontro um táxi parado no meio do nada (nem sei como ele conseguiu entrar naquela região). Proponho, sem muita esperança, uma corrida. Ele aceita. O salvador da pátria. Tinha marcado para pegar um grupo que já tinha lhe pago.

19:00 Chegamos em casa.  O taxista havia acabado de receber um telefonema do grupo. Eles o esperavam. Vai dar tempo de voltar. A corrida foi R$ 40,00. Ainda tive fôlego para brincar com ele e dizer-lhe que não pagaria isso. Dei-lhe, na verdade, tudo que tinha na carteira cerca de R$ 70,00. Estava morto.

Agora lhes pergunto: “dá pra colocar culpa na idade?”. Só sei que Ariano Suassuna tem razão quando diz (me foi contado por Luis Eduardo Menezes) “o que é ruim de viver, é bom de contar”. 

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