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terça-feira, 23 de outubro de 2007

Tropa de Elite

Assisti ao filme Tropa de Elite na semana passada (no cinema!). Como obra de entretenimento acho-o muito bom. O roteiro é bem feito e a idéia de começar a contar a estória da metade e depois continuá-la no meio do filme, mesmo não sendo nova, teve resultado surpreendente. A câmera é ótima, dinâmica, captura bem as incursões às favelas o que traz realismo e mantém a atenção do espectador. O elenco é bom muito embora Wagner Moura esteja em um patamar bem superior aos outros. Não o conhecia e fiquei surpreso com a sua versatilidade. Consegue até fazer rir em um filme tão trágico. Acho que Tropa de Elite inscreve-se com louvor na lista das recentes boas produções brasileiras que vêm mostrando que temos condições de ter um cinema tão rico como nossa música. O segundo aspecto a se analisar é sobre o quanto o filme contribui ao problema da Segurança Pública no Brasil. E sobre esse ponto a complexidade da análise é muito maior. Evidente que somente pelo fato de trazer as mazelas do setor às claras, já o faz muito importante. O filme mostra duas alternativas ao protagonista Capitão Nascimento interpretado por Wagner Moura (que seriam as mesmas apresentadas a todo policial): ou se é corrupto e omisso ou se é íntegro, violento e age seguindo a filosofia de que os fins justificam os meios. Ao fazer isso o filme apresenta uma armadilha ao telespectador menos atencioso e desconhecedor da questão da segurança. Passa-se a acreditar que não há outra alternativa e que, sendo assim, a escolha de ser um policial em “guerra” é a mais digna e louvável. Não surpreende quando soube que recentemente os soldados do Bope (Batalhão de Operações Especiais) do Rio de Janeiro foram aplaudidos quando se exercitavam na Praia de Copacabana. A opção da legalidade, da qualidade, da inteligência e do respeito às leis não é colocada no filme. Na verdade, ela é esboçada quando Matias o policial negro é mostrado como um estudante de direito e que sabe fazer mapeamento criminal. Só que a cruel realidade acaba com todas as esperanças. Não se pode criticar o filme por isso. Busca retratar uma situação caótica (mesmo que um pouco caricaturada ao meu ver) e propor soluções seria por demais arriscado e até mesmo prepotente. Um outro aspecto relevante do filme é a forma como os valores morais dos personagens são apresentados e em particular dos jovens de classe média alta. Eles são engajados em movimentos sociais, inseridos nas favelas, mas coniventes com o domínio dos traficantes e ainda se apresentam como alimentadores de um sistema corroído por serem consumidores de droga. Novamente, há aqui uma escolha deliberada de mostrar os personagens como tendo seu lado bom e ruim. Ironicamente, esse alarme de como os valores morais da sociedade estão deteriorizados ocorreu até na distribuição do filme quando se derramou cópias piratas, inclusive dentro das própias corporações policiais. Em resumo, Tropa de Elite dá muito assunto para discutir e vale a pena assistir (no cinema é claro!). Só queria recomendar que não nos esqueçamos que da mesma forma que o problema da segurança é complexo, as soluções também as são. Há que se acreditar e buscar implementar, não somente uma terceira opção que não existe no filme, mas uma quarta, uma quinta e tantas outras que busquem o respeito às instituições, às leis e à dignidade humana.

5 comentários:

Anônimo disse...

Se partirmos do princípios de que os profissionais que fazem a segurança tem buscado o respeito às leis e a dignidade humana e que a premissa de que a in(segurança) vem aumentando é verdadeira, pergunto será que as medidas devem continuar homeopáticas ou se já não deveríamos ter adotado um medicamento na veia.

Talvez eu tenha utilizado um "palavreado" meio fora do circuito acadêmico ou policial mas são minhas as palavras.

Vasco Furtado disse...

Caro anonimo,
Se medicamento na veia significa choque de gestao, inteligencia, acoes intersetoriais e articuladas e todo um outro conjunto de coisas que ja venho escrevendo, concordo com vc. No entanto, se vc estiver se referindo a violencia, justica pelas proprias maos, vinganca, etc. Nao acredito de jeito nenhum. So faz piorar.

Anônimo disse...

Professor,

Esta parte que você concorda é o que todo mundo fala só que nada acontece. No Ceará no tempo do Tasso foi feito um choque de gestão, ou sei lá o nome, na Segurança Pública e o que está melhor hoje ? Ações intersetoriais é só no que se fala, com a Educação, Trânsito, Iluminação Pública, e o que melhorou ?
Não falo de violência com as próprias mãos e muito menos de vingança. Falo de ações mais concretas e de rápidas respostas que eu não sei quais são, se soubesse talvez fosse o Secretário da Segurança

Vasco Furtado disse...

Anonimo,
A questao eh que alguns a algum tempo falam mas muitos que devem fazer algo nao o fazem. Nao basta falar tem que fazer e com continuidade. Para nao me tornar repetitivo, veja http://vfurtado.blogspot.com/2007/08/solues-milagrosas-para-segurana-pblica.html
Sobre acoes concretas e mais precisas todas tem que passar por planejamento, treinamento,gestao, inteligencia, motivacao, etc. etc. Isso nao se consegue com uma varinha de condao. Eh muito trabalho, trabalho e trabalho. A questao eh saber se estamos trabalhando nessa direcao.

cosmonauta disse...

Gostei muita da tua anàlise do filme. Vi ele ontem - admito que numa còpia pirata aqui na França! - e estava procurando algum texto que tratasse o filme não em termos de produto de entretenimento.

O filme é realmente bom, mas creio que a "mensagem de fundo", se hà alguma, é um tanto preocupante, porque parece apontar não apenas para um estado de guerra - é preciso ter cuidado quando se usa essa expressão, pois pode-se justificar muitas coisas que realmente acontecem numa guerra civil -, mas para uma não-solução, ou o que é pior uma solução ao estilo "circulo vicioso". basta lembrar que o filme termina em meio ao conflito pessoal entre o BOPE e os traficantes.