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quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Pagamos Muito Imposto?

Aproveitando o debate atual sobre o fim ou não da CPMF, andei refletindo sobre se pagamos realmente muito imposto. Evidente que ninguém gosta de pagar imposto e sempre teremos a tendência de dizer que pagamos demais. A relação PIB e carga tributária é sempre usada para mostrar que estamos em desvantagem comparados com outros países, principalmente os mais desenvolvidos. Mas seria essa comparação honesta? Que país no mundo tem uma sociedade com tanta desigualdade social e que tem uma constituição que estendeu serviços de assistência a todos? Quem conseguiu crescer a população urbana em torno de 800% em cinqüenta anos como fizemos? Somente esses fatores já são indicativos de que temos sim que ter uma conta bem elevada a pagar e que talvez o problema não seja tão simples de ser abordado. Por isso ao invés de tentar dar uma resposta absoluta à questão, preferi olhar para o problema por diferentes perspectivas que me parecem mais esclarecedoras. A primeira perspectiva é de que o sistema tributário brasileiro é injusto. Quem ganha muito paga pouco (muitas vezes nem paga) e quem ganha pouco paga muito (até porque não tem a possibilidade de não pagar). Isso não se dá somente por falhas no sistema arrecadador e fiscal, mas por toda uma conjuntura de enfraquecimento das instituições republicanas. Por exemplo, há uma espécie de sonegação legalizada que é estarrecedora. Leis casuísticas e inépcia no judiciário (que faz com que o processo de cobranças de dívidas se estenda indefinidamente) são exemplos de como pode se deixar de pagar imposto legalmente. Escutei uma vez o ex-ministro da Saúde, Adib Jatene, dizer que quando da implantação da CPMF, a Receita Federal descobriu que dos cem maiores pagadores de CPMF, sessenta nunca tinham pago imposto de renda! Tenho encontrado muitos empresários que dizem que o que mais o incomodam com o pagamento do imposto é o fato de que o fazem não competitivos. É aquele sentimento de que se ele pagar e o concorrente não, ele perde a competição. A questão sob essa perspectiva não é então se é muito ou pouco imposto, mas se ele é justamente distribuído e equitativamente cobrado. A segunda perspectiva é que o retorno do pagamento do imposto não é satisfatório. Ou seja, a qualidade do serviço público é ruim e assim o imposto fica “caro”. Essa reclamação se faz particularmente veemente quando oriunda da classe média, pois a mesma acaba tendo que abster-se de usar alguns serviços, notadamente de educação e de saúde, exatamente por essa má qualidade. De qualquer forma, é bom lembrar que imposto é forma de distribuição de renda. Não se paga imposto só porque se espera receber um serviço público de qualidade para si. Faz-se isso na esperança que a sociedade como todo, principalmente os mais carentes, possam melhorar suas condições de vida. A terceira perspectiva refere-se a enorme complexidade do sistema tributário (a começar pela quantidade de impostos). Trata-se de um sistema tecnocrático, o que torna o processo muito pouco transparente e que impossibilita totalmente a participação popular. Já escrevi sobre o quanto me surpreende escutar de cidadãos que a serem perguntados se desejam receber a nota fiscal dizem simplesmente que não (clique aqui para ler o texto). Não conseguem entender que há uma parte do que está pagando que deve ir ao governo e a nota fiscal é a forma de garantir com que isso aconteça. Ainda por cima não conseguem entender o que aquele pagamento impacta no seu dia-a-dia. Dado todo esse contexto descrito por essas perspectivas, é normal acreditar que se paga demais e tende-se a pensar de forma simplista que há dinheiro de sobra. O grande debate deve se concentrar na reforma fiscal que simplifique o processo atual, fazendo-o transparente e trazendo a população à participação. Poder-se-á mais facilmente realizar um processo mais justo de arrecadação e distribuição. Feito isso, será mais fácil de responder se pagamos muito imposto.

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